Ano Novo: o que você deseja para além de si?

web3-hands-alms-heart-love-mercy-shutterstock

Se cuidar de nós mesmos fosse suficiente, tudo seria bem diferente…

Certa vez acompanhei uma cerimônia de Rosh Hashaná num centro de Kabalah. Achei bastante interessante a experiência: um pouco antes, tivemos uma palestra em que o palestrante sugeriu que parássemos um pouco para pensar em alguns desejos para o ano seguinte e escrevêssemos num papel. Todos prontamente o fizeram. Pouco tempo depois ele disse que acreditava que todos esses desejos seriam realizados, mas ressaltou que os mesmos não poderiam ser individuais, tinham que ser universais. Todos reclamaram, pois estavam tentando acreditar que aqueles desejos individuais poderiam e precisariam ser realizados e não fazia tanto sentido em pensar em algo que não fosse “meus desejos”.

E assim caminha a humanidade, como dizia Lulu Santos, ou como desanda, tropeça…

Quanto se sabe a respeito de pessoas que tiveram seus desejos realizados e isso foi a porta de entrada para mais frustrações… O ser humano é muito complexo e acreditar que a satisfação de desejos é a solução é bastante ingênuo e falso. Não estou dizendo para não corrermos atrás de nossos sonhos, mas é preciso compreender que isso é apenas um lado da moeda. Quando a moeda gira, o outro lado vem nos mostrar que a vida tem surpresas e não se limita ao nosso reflexo.

Como mencionei no artigo anterior, temos toda uma estrutura cerebral e mental que visa a nos proteger das ameaças externas e que faz todo sentido existir, não fosse todo o sofrimento que ela carrega junto. Quanto mais acreditamos que precisamos de proteção, mais fechados nos tornamos, mais desconfiados, mais egoístas e, ao ver de muitos da sociedade, mais corretos (“cada um que cuide de si”). Acreditamos tanto nessa visão que podemos mesmo aceitar a ideia delirante de que somos separados do mundo, de que nada efetivamente nos afeta e que nossas ações podem até passar despercebidas.

Estava assistindo a um programa de jornal na televisão que mostrou um atendimento diferenciado a moradores de rua nesses dias de Natal. Ao entrevistarem um deles, bem idoso, ele disse que estava muito alegre, pois percebeu que se alguém ali o via, ele de fato existia. Isso é muito forte e verdadeiro: precisamos do outro para existir. E esse outro nos faz existir ao nos devolver a nós mesmos e possibilitar a nossa construção nessa relação.

Para podermos ter relações saudáveis, o ideal é que não estejamos vivendo ameaças e medos à flor da pele. É preciso que façamos nosso próprio holding (acolhimento) diário, darmos conta de nossas angústias, para que os outros não sejam o palco dos nossos sofrimentos e nossas decepções, para que seja possível tolerar a si mesmo e, consequentemente, as relações. Ao termos essa atitude de autocompaixão, é possível estabelecer compaixão pelos outros e ver que o mundo vai além dos “meus desejos”.

Mas seria ainda mais desafiador se conseguíssemos ser altruístas e compassivos mesmo em situações de sofrimento. Até porque, se esperarmos estar sempre “quites” com nós mesmos, talvez a consideração pelo outro nunca surja. Então que tal transformar essa condição faltante (essa falta, esse vazio interior), que nós é própria, em entrega? Que tal olharmos para o outro naquilo que nos torna comum, e não apenas olhar para as diferenças, que nos levam a julgar em melhor e pior?

Ao olharmos para o que nos torna COMUM, somos passíveis de COMUNicação, de troca, de fazer-se em diversos ambientes, de movimentar sofrimentos e alegrias com leveza, de conhecer abertamente, curiosamente, sem desconfianças… E assim existe vida, e podem existir novos futuros e presentes verdadeiros.

SEJA. É isso que eu desejo a você neste momento de passagem. Feliz 2018!

 

Referência:

BIAGGI, M.B. Compaixão: quando o amor incondicional pode mudar as vidas de todos. Disponível em: <https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/2017/12/24/noticias-saude,218975/compaixao-quando-o-amor-incondicional-pode-mudar-as-vidas-de-todos.shtml&gt;

 

Grande abraço,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga Clínica, Psicopedagoga, Coach (Resiliência) e Instrutora de Mindfulness. Escritora (crônicas literárias, artigos acadêmicos e profissionais). Atende na Clínica com Psicoterapia (enfoque psicanalítico) e Coaching em Resiliência (controle do estresse). Ministra palestras e treinamentos comportamentais em nome da sua empresa (Ponto de Palestras e Treinamentos). Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contate-me: contato@cristinamonteiro.com.br

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *