Bird Box – Depressão: enfrentamento e cura

O filme Bird Box estreado por Netflix conta uma história baseada em metáforas. As metáforas se dão em diversos âmbitos, mas elas nos aparecem inicialmente envolvendo os nossos sentidos. É preciso repensar então o enxergar e o ouvir. Vamos aqui a algumas reflexões que o filme nos traz:

 

O que as pessoas não podiam ver?

Se era tão extasiante ver, por que ao ver as pessoas se matavam e matavam outras?

O que elas deviam ouvir?

O que elas deviam recusar?

Qual o papel dos loucos no filme? Por que eles podiam ver sem se matar?

 

Para mim, este filme mostra uma história clássica de enfrentamento de um sofrimento psíquico. Ele pode também estar tratando de uma questão social de ordem intolerante (como o fascismo, por exemplo), mas, neste momento, prefiro pensar que se trata da dor da depressão e do enfrentamento da mesma.

 

E o que é preciso fazer para enfrentar a depressão? De acordo com o filme:

 

  1. Lidar com muita seriedade diante do sofrimento;
  2. Ter medo e usar o medo como medida de proteção;
  3. Ter uma estrutura cognitiva que auxilie na construção e no seguir um caminho de proteção e de salvação;
  4. Calar os ouvidos para as vozes sedutoras da nossa mente, mas que não nos ajudam;
  5. Ouvir atentamente a voz da sabedoria da nossa mente: o canto dos pássaros.

 

Vamos analisar atentamente cada uma dessas variáveis:

 

  1. Lidar com muita seriedade diante do sofrimento

O que muitos dizem de alguém que está com depressão? Que é falta de Deus, que é frescura (“doença de rico”), que “já já passa”, que basta reagir. É preciso considerar e aceitar o sofrimento mental como algo que faz parte da natureza humana. Além disso, é preciso humildade para reconhecer-se nessa mente confusa e negativa, ao mesmo tempo em que é preciso coragem para não se deixar envolver cegamente pela ruminação de pensamentos negativos, genéricos, autocentrados e catastróficos.

 

  1. Ter medo e usá-lo como medida de proteção

O medo aqui entra como algo essencial para sabermos para quem devemos abrir a porta e para quem devemos mantê-la fechada. E aqui não me refiro apenas a pessoas (como no caso, os loucos do filme ou as pessoas que haviam sido afetadas pela “coisa”), mas, principalmente, a conteúdos mentais.

Que conteúdos mentais lhe afligem? Eles são sedutores, eles parecem lhe defender, mas, na verdade, são a verdadeira fonte de sofrimento. Lembrar que agora você zela por esta porta de entrada.

 

  1. Ter uma estrutura cognitiva que auxilie na construção e em seguir um caminho de proteção e de salvação

A importância de ter recursos materiais e de ter comunicação como estratégias de construção de um caminho seguro. No caso do filme, os recursos eram alimentos, barco, vendas, árvores, corda (para marcar o caminho na terra).

Na vida real, eu diria que o principal recurso é uma boa rotina (organizada e planejada), ter um estilo mindfulness de vida (estar presente), ter sonhos (e criar condições para realizá-los) e ter uma boa rede de relacionamentos (que se importa com você e com a qual você se importa. Lembre-se: importar-se cria resiliência).

 

  1. Calar os ouvidos para as vozes sedutoras da nossa mente, mas que não nos ajudam e ouvir atentamente

Nossa mente não é algo único. Existem vários estados mentais que acontecem a todo momento e que nos levam para lá e para cá. Ao fecharmos os olhos (vendas no filme), é possível ficar com os ouvidos apurados. Aí seguimos as instruções objetivas, mas também nos damos conta da voz sedutora que nos puxa para estados mentais com memórias arraigadas, que geralmente apresentam conteúdos pesados, de injustiça, de não-pertencimento, e que nos impulsionam a ter raiva, medo e nos afastar erroneamente dos outros.

 

  1. Ouvir atentamente a voz da sabedoria da nossa mente: o canto dos pássaros

Quando conseguimos rotular nosso lado mental doentio, conseguimos ficar mais e mais tempo em silêncio e ouvir então o nosso canto dos pássaros interno. Esse canto mostra a simplicidade da vida, a beleza e a harmonia. E lá estará toda a beleza da nossa mente raiz, nosso fundo do oceano, onde encontramos paz e serenidade que tanto buscamos. E onde também estão as diretrizes corretas para nos alinharmos com a sabedoria da vida. Em outras palavras, aí descobrimos o que de fato devemos fazer em nossas vidas.

 

Compreendendo a depressão

Costumo encarar a depressão como um funcionamento mental que nos leva a criar uma barreira imaginária entre o indivíduo e o mundo e a tentar se desenvolver num mundo à parte.

A criação dessa barreira aparece inicialmente como medida de proteção, mas ela precisa ser vista, quebrada aos poucos e é preciso que haja uma reintegração social. É a partir da reintegração que o sujeito conseguirá se ver no outro e se construir.

Somos seres relacionais e não existimos sozinhos. É necessário enfrentamento e sabedoria para conseguirmos estar conectados à vida, refazendo nossos laços e se construindo momento a momento.

 

Sigam-me,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga (PUC-SP), Psicopedagoga (Instituto Sedes Sapientiae) e Psicanalista. Atende na clínica com psicoterapia (enfoque psicanalítico) e coaching em resiliência (controle do estresse) – consultório em Pinheiros (São Paulo). Ministra palestras e treinamentos comportamentais in company pela sua empresa Ponto de Palestras e Treinamentos. Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contatem-me: contato@cristinamonteiro.com.br

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