Ensaio sobre a Cegueira

Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago, romance escrito em 1995, três anos antes de o autor receber o prêmio Nobel de Literatura. Eu tive a oportunidade de lê-lo, ainda adolescente, assim como li Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, que irei comentar num próximo post. O Ensaio sobre a Cegueira também virou filme então, quem puder, assista.

 

 

Por que mencionar esta obra?

Diante do que estamos passando, eleições tão impactantes, lembrei-me de quando li e assisti ao filme de José Saramago: senti náuseas, choro e ranger de dentes – tanto na leitura, quanto no filme, quanto nessas eleições.

Nas redes sociais, nos grupos de WhatsApp, as pessoas me implorando para votar num determinado presidenciável. Eu confusa. Meu corpo doía. Saí de vários grupos, bloquei diversas pessoas nas minhas redes sociais. Mas isso é porque eu, como poucos (em relação à grande massa), estou conseguindo entender e enxergar o que está por vir. E isso é um ato de louvor? Não, não me vanglorio, de modo algum, mas me sinto no dever de me comunicar, para aqueles que puderem e quiserem me ler/ouvir enquanto há democracia. Porque se ingressarmos numa ditadura, não poderei escrever nem falar mais nada. Tudo será apagado literalmente.

 

Resumo da obra

Segundo o próprio autor do Ensaio Sobre a Cegueira:

“Este é um livro francamente terrível com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. É um livro brutal e violento e é simultaneamente uma das experiências mais dolorosas da minha vida. São 300 páginas de constante aflição. Através da escrita, tentei dizer que não somos bons e que é necessário termos coragem para o reconhecer”.

O livro começa da seguinte forma: “Um motorista parado no semáforo, subitamente descobre que está cego”. E, então, tem-se início uma epidemia de cegueira, uma cegueira branca que ninguém sabe explicar, e que culmina num caos, com pessoas isoladas e abandonadas à própria sorte.

Os personagens perdem seus nomes, suas identidades, todos os seus bens. E assim são descritas: a mulher do médico, o cego da pistola, o rapazinho estrábico, a rapariga de óculos, os soldados, a velha do primeiro andar, o cão de lágrimas. Um grande destaque para a história é que apenas uma personagem, a “mulher do médico”, permanece enxergando o tempo inteiro, mas acabou tendo que fingir ser cega para se adaptar à situação.

 

“O pior cego é aquele que não quer ver”

A “cegueira branca” que toma conta da cidade é uma metáfora. Ela não diz respeito a uma doença biológica, nem mesmo um castigo divino. Trata-se da cegueira que o sistema e os tempos atuais nos envolvem.

Atualmente, as pessoas já não conversam, só se falam por mensagens e posts. As cabeças estão sempre curvadas para baixo, para a tela do celular. A literatura e a formação de opinião foram substituídas por vídeos compartilhados com mensagens prontas e “fake news” com tudo mastigado. O horror foi pregado e todos querem se livrar disso. Mas assim, dessa forma, teremos péssimos resultados.

Voltando ao livro, aquele que vê é aquele que percebe a crueldade a que fomos submetidos e não aceita viver nesse mundo sem esperança. Já os cegos, como não veem e não podem ser vistos, acabam revelando suas faces mais sombrias. Eles vivem literalmente o caos da destruição humana, abandonando qualquer traço de humanidade, e se resumem a lutar brutalmente pela própria sobrevivência, desesperadamente, como animais.

E a mulher do médico?

“A mulher do médico compreendeu que não tinha qualquer sentido, se o havia tido alguma vez, continuar com o fingimento de ser cega, está visto que aqui já ninguém se pode salvar, a cegueira também é isso, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança.”

Na visão do autor, o ser humano, é moral e culturalmente selvagem, egoísta e dominado por apetites bárbaros. Sendo assim, é preciso dominar, com sabedoria, essas emoções. Isso precisa ser feito com educação, respeito, diálogo, construção e reflexão. Quando isso é imposto de fora, sem margem alguma para a autoconstrução, como em alguns regimes totalitários em que isso não comporta, viveremos, na pele, a barbárie. Diante de nós hoje, apenas o apoio à democracia. De qualquer maneira, diante desse cenário, temos a certeza de que viveremos tempos sombrios.

 

Para continuidade dessa reflexão, sugiro a leitura do texto de Sigmund Freud: Psicologia das Massas e Análise do Ego, que aborda que, quando perdemos a segurança e o sentido de pertencimento, qualquer sentimento ou emoção de um grupo social tende a ter grande influência sobre os indivíduos. É a ideia de “somos todos um”.

 

Referência:

Resumo do livro, Ensaio Sobre a Cegueira, José Saramago, disponível em: <http://www.vogaisecompanhia.pt/ensaio-sobre-a-cegueira/>, acesso em 09/10/2018.

 

Psicologia de Grupo e a Análise do Ego (Freud) | Resumo / Resenha, disponível em: <https://psicoativo.com/2017/01/psicologia-de-grupo-e-analise-do-ego-freud-resumo-resenha.html>, acesso em 09/10/2018.

 

Sigam-me,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga (PUC-SP), Psicopedagoga (Instituto Sedes Sapientiae) e Psicanalista. Atende na clínica com psicoterapia (enfoque psicanalítico) e coaching em resiliência (controle do estresse) – consultório em Pinheiros (São Paulo). Ministra palestras e treinamentos comportamentais in company pela sua empresa Ponto de Palestras e Treinamentos. Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contate-me: contato@cristinamonteiro.com.br

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