Mindfulness: a transformação interior nasce da escolha do modo como lidamos com nossos problemas

O que fazemos afeta a maneira como nos sentimos. E podemos mudar a maneira como nos sentimos mudando o que fazemos.

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Lidar com problemas cotidianos é diferente de lidar com problemas emocionais. É preciso estar num constante entrelaçamento entre o entendimento, a prática e a reflexão que nos estruturam para vivermos a transformação interior. Interessante poder compreender que os padrões mentais que nos mantêm aprisionados ao sofrimento emocional são fundamentalmente os mesmos onde reside todo o nosso potencial de desenvolvimento. Mas para isso, precisamos desenvolver as habilidades corretas.

Teasdale, Williams e Segal nos explicam em sua obra – Manual prático de mindfulness (meditação da atenção plena): um programa de oito semanas para libertar você da depressão, da ansiedade e do estresse emocional – de modo claro e habilidoso como é diferente a “marcha” que usamos para solucionar problemas factuais (denominados de “modo de fazer”) da “marcha” que deveríamos utilizar para resolver problemas emocionais (denominados de “modo de ser”).

 

Compreendendo as emoções

As emoções podem deturpar nossa experiência de tal maneira que suas consequências se alastrem ainda mais. Acessada por “gatilhos” (estímulos) externos ou internos, emoções e sentimentos podem desencadear padrões mentais compatíveis de pensamento, memória e atenção, de tal modo a ingressarmos em uma espiral de disposição de ânimo que intensifica nosso estado de humor. Nessa espiral descendente, nossa preocupação ruminativa de sentimentos e pensamentos nos faz sentir ainda pior.

A explicação que nos embasa essa estrutura é a de que pensamentos não são fatos e que sentimentos dão origem a padrões de pensamento relacionados. Mas, quando “os pensamentos e a disposição de ânimo se entrelaçam, os pensamentos podem ser muito convincentes e difíceis de ser encarados como pensamentos”. (p.163)  Assim, nossas reações à infelicidade têm o poder de transformar o que poderia ser encarado como uma tristeza breve e passageira em uma insatisfação e infelicidade intensas.

 

As emoções como nossas aliadas

Ao alterarmos a postura de não querer lidar com as emoções para uma postura de abertura possibilita uma quebra na cadeia de reações automáticas habituais. Com o entendimento e as habilidades corretas, podemos escapar desses ciclos viciosos, aprendendo a reconhecer padrões de pensamento e habilidosamente se desembaraçar deles, refocalizando a atenção. Tal processo de reagir mais de maneira hábil, positiva e proativa envolve basicamente dois passos:

 

  1. Numa experiência investigativa dos estados mentais, desenvolvemos uma atenção interessada e delicada para a própria experiência, em vez de pensar analiticamente a respeito da mesma.

 

  1. Cultivar um novo modo mental que nos permita reagir mais habilmente a emoções desagradáveis e experiências interiores indesejadas. Inicialmente, é preciso aceitar a experiência, concedendo um espaço para o que quer que esteja acontecendo, ao invés de tentar criar algum outro estado. Com isso, cria-se um “espaço interno” no qual a dificuldade pode ser mantida mais gentilmente com menos esforço, deixando que a experiência seja como é, sem julgá-la ou tentar torná-la diferente. A partir dessa percepção, podemos escolher o que precisa ser mudado, caso isso seja necessário.

 

Modo mental de fazer versus modo de ser

 

  1. Sentir diretamente a experiência ao invés de relacionar-se com a experiência por meio do pensamento.
  1. Voltar a habitar o momento presente: sair do “piloto automático” e viver com percepção consciente de escolha.
  1. Ao estar no aqui-e-agora podemos pensar no passado e no futuro mas de modo integrado à nossa experiência atual e não ruminativo.
  1. Deixar de precisar evitar, escapar ou se livrar da experiência desagradável aceitando as coisas como elas são e não como deveriam ser.
  1. Conseguir encarar os pensamentos como eventos mentais, parte do fluxo da vida, e não como reais.
  1. Deixar de viver controlado por metas, entregando-se à sensibilidade e à amplitude da vida, valorizando o momento.
  1. Ter a atitude básica de tolerância, deixando de viver a dura lacuna entre o que somos e o que deveríamos ser, que nos leva à autocrítica e autorreprovação.

 

A atenção plena

Atenção plena pode ser definida como a atenção consciente que emerge quando prestamos atenção de uma maneira particular às coisas como elas são para nós, com foco no sentimento e não no pensamento, numa sensação direta com o corpo.

“A atenção plena fortalece as redes do cérebro que regulam a reatividade emocional, reduzindo o tamanho e o impacto da amígdala – o sistema de lutar, fugir ou ficar imobilizado; ela fortalece as redes que estão por trás da nossa capacidade de sentir compaixão por nós mesmos e pelos outros e ela modifica os trajetos que normalmente produzem a ruminação habitual e inútil sempre que uma disposição de ânimo triste se manifesta.” (TEASDALE, p. 42)

Podemos, então, conhecer o nosso modo mental de momento a momento, estando conscientes quando estivermos prestes a cair no domínio do modo de fazer compulsivo. Tal estado nos oferece uma maneira de despertar do piloto automático, possibilitando a nós responder (com escolha) ao invés de apenas reagir às situações.

 

Mindfulness (meditação): intenção clara e foco na respiração

Numa prática de meditação, a principal intenção não é frear ou calar a mente pensante, mas reconhecer os pensamentos como tais e, da melhor forma possível, sem esforço, abandoná-los e voltar a focalizar a respiração.

Ao fazê-lo, reconhecemos que estamos no modo de fazer e nos libertamos e entramos no modo de ser. E assim, deslocando intencionalmente a atenção de uma maneira delicada e gradual na direção de sensações desconfortáveis, começamos a desapegar do hábito de evitar os sentimentos desagradáveis e podemos nos conectar a sentimentos leves e agradáveis. Nesse momento, o espaço de respiração nos prepara para uma atitude mental diferente e envolvida com o presente.

E é nossa intenção clara que nos leva a persistir, fazendo com que pratiquemos, querendo ou não, lembrando-nos do que valorizamos verdadeiramente, tornando-nos realmente conscientes de nós mesmos, das outras pessoas e da vida.

 

Referência:

TEASDALE, J.D., WILLIAMS, M., SEGAL, Z. Manual prático de mindfulness (meditação da atenção plena): um programa de oito semanas para libertar você da depressão, da ansiedade e do estresse emocional. São Paulo: Pensamento, 2016.

 

Grande abraço,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga, Psicopedagoga, Orientadora Profissional e de Carreira e Coach. Escritora (crônicas literárias, artigos acadêmicos e profissionais). Atende na Clínica com Psicoterapia (enfoque psicanalítico) e Coaching em Resiliência (vida e carreira), ministra palestras e treinamentos comportamentais em nome de sua empresa (Ponto de Palestras e Treinamentos). Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contato: crifmonteiro@gmail.com

2 Comentários


  1. Cristina, não há dúvida que o mais difícil é reconhecer os pensamentos como tais e, da melhor forma possível, sem esforço, abandoná-los.

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    1. É verdade George. Ainda tendemos a acreditar em nossos pensamentos antes de fazê-los passar pelo crivo e estes serem reconhecidos como “fatores mentais”. Este é um treino analítico e constante que precisamos buscar com clareza e propósito.

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