Autismo “fora da caixa”

“SAWABONA” “SHIKOBA” (diálogo africano):

“- Eu te respeito, eu te valorizo, você é importante pra mim.”

“- Então eu existo pra você.”

 

Autismo no filme “Farol das Orcas”

Neste drama, estrelado no ano passado no Netflix, uma mulher (Lola) e seu filho autista de 11 anos (Tristan) vão à Patagônia na expectativa de que um guarda florestal (Beto) e as orcas ajudem-nos a lidar com suas emoções. Semelhante à análise que fiz em relação ao filme “O Encantador de Cavalos” – http://www.cristinamonteiro.com.br/o-papel-do-psicanalista-e-o-sentido-da-analise/ – é no farol das orcas que a mãe procura desesperadamente em um homem e em um lugar desconhecidos, com a ajuda dos animais, um novo sentido para a vida.

Isso só foi possível porque Lola viu em Beto algo que representava um grande saber (O Grande Outro – “A” – segundo Lacan). Ao projetar nele esta imagem de “salvador”, estabelece-se uma relação de afeto – “transferência” – que tece o berço para o processo em que algo novo pode ser vivido. O mesmo ocorre em relação ao analista quando o sujeito chega em análise, como mencionei anteriormente no artigo: http://www.cristinamonteiro.com.br/lacan-a-partir-do-filme-a-beira-mar/.

É a partir dessa relação de autoridade (que Lola estabelece com a figura do Grande Outro) que se dá a autorização dessa experiência. No filme, Beto sente curiosidade e interesse em conhecer de fato quem era aquela família e notadamente aquele menino Tristan, sem os rótulos que o caracterizavam. Ao estarem todos ali entregues verdadeiramente, Beto pôde compreender os padrões que sustentavam Tristan e respeitá-los num primeiro momento: tudo tinha ali um lugar muito definido, nada podia efetivamente transitar.

Numa visão psicanalítica sobre o autismo, temos um sujeito imerso no Real: a linguagem não pôde entrar na vida da criança como mediadora por meio da lalangue (linguagem mãe-bebê inicial), mas apenas na concretude, impedindo o ato de simbolizar. Tal diagnóstico deve ser apenas um ponto de partida e nunca um ponto de chegada, para que todos os que ali se relacionem consigam existam.

No filme em questão, essa transformação aparece representada na forma como Tristan brincava: apenas posicionando os objetos de forma linear e estática, na concretude com que vivia sua vida. Na construção de uma relação saudável, esses mesmos objetos que inicialmente apenas se alinhavam, agora compunham a imagem de um rabo de orca – representante do objeto que Beto carregava no pescoço, seu amuleto. Tristan havia sido tocado por aquela relação com os humanos e com as orcas, saindo do limite reducionista da concretude e podendo, então, simbolizar.

 

Sigam-me,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga, Psicopedagoga, Coach, Palestrante, Psicanalista. Atende na Clínica com Psicoterapia (enfoque psicanalítico) e Coaching em Resiliência (controle do estresse). Ministra palestras e treinamentos comportamentais em nome da sua empresa (Ponto de Palestras e Treinamentos). Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contate-me: contato@cristinamonteiro.com.br

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *