Limite não limita: é sinal de saúde mental

Limite: compreendendo seu verdadeiro significado

Atualmente falar em “limite” parece nos tolher a possibilidade de expressão. No entanto, o limite é a possibilidade inicial de enxergar a si mesmo como separado dos outros, bem como olhar atentamente aos próprios conteúdos internos. Ao fazer isso, reconhecer os agradam e os que destroem, separando-os e integrando-os à consciência. Tal processo, quando bem sucedido, reflete externamente – em relacionamentos que terão por base a manutenção do limite do outro (respeito) – bem como internamente, na superação de barreiras limitantes.

“Atingir o limite não é encontrar um obstáculo ou uma punição, mas uma saída em direção à sanidade e incondicional bondade dos seres humanos. (…) Chegar ao limite não é algum tipo de punição. Na verdade, sentir medo e tremer, quando estamos prestes a morrer, é um sinal de saúde. Outro sinal de saúde é não sermos destruídos pelo medo e pelo tremor, mas encará-los como um aviso de que está na hora de interromper a luta e olhar diretamente para aquilo que nos ameaça. Sentimentos como decepção e ansiedade são como mensageiros avisando-nos de que estamos no limiar de um território desconhecido.” (CHÕDRÕN, p.10).

Tal ensinamento auxilia-nos a quebrar o paradigma que estabelecemos frente ao termo “limite”.

A seguir, abordarei, de modo poético e sigiloso, um caso clínico recente para ilustrar a importância do atingimento de limites internos na busca pela saúde mental.

 

Limite X Superação: Caso Clínico

Era nos extremos da corda bamba, entre a vida e a morte, sob o domínio de impulsos agressivos, depressão e retaliação que aquela paciente (A.) me aparecia. Seu corpo gritava, pois era ali que o limite se buscava: no corte dos pulsos, no escorrer do sangue seguido pelo olhar turvo. E a vida, contrariamente àquelas tentativas, continuava a pulsar no empenho do trabalho terapêutico. A vontade de viver existia, mas não se reconhecia o sentido daquela vida costurada no sofrimento.

Após alguns meses de terapia, essa mesma atitude repetitiva teve seu momento de pausa e reflexão no decorrer da ação: “O que você está fazendo?” – perguntava A. a si mesma ao dar-se conta de seu comportamento automático e, ao mesmo tempo, interrompendo-o, incorporando-o à consciência.

Constatou que parecia estar dominada por um feixe de emoções que a deturpavam, ao mesmo tempo em que pôde questionar seu ego, que dizia para interromper a dor, mas não a vida. Então, pôde finalmente ver, enxergar a si mesma.

Aturdida, adormeceu. Já não cabia ao seu corpo ser o depositário de tanta dor: ele estava ali não apenas fisicamente, mas passou a existir como membrana psíquica, que contém e envelopa sentimentos e emoções. Passou a suportar o sofrimento, que podia enfim existir com novos contornos e arestas aparadas, menos ameaçadoras que os objetos externos empunhados até então.

Nova vida brotava: a saúde passou a estar preservada da dor, no limite que destaca a estima por si mesma, a compreensão, o suporte à intolerância e às frustrações. Tudo estava ali, cada qual em seu lugar, e o brilho na tez pela lucidez refletia um novo despertar.

 

No limite: uma nova postura para a vida

“Reagimos contra a possibilidade da solidão, da morte, de não termos nenhum apoio. O medo é uma reação natural ao nos aproximarmos da verdade. Quando nos comprometemos a ficar exatamente onde estamos, nossa experiência torna-se muito vívida. Se não há nenhum lugar para onde fugir, tudo se torna muito claro.” (CHÕDRÕN, p.6)

Aceitar o nosso estado emocional é o primeiro passo para conseguir mudá-lo de fato. Quando não aceitamos conscientemente, tendemos a ter reações inconscientes, seguindo-o cegamente ou a reagindo em seu oposto. Ambas essas reações (seguir ou fazer o inverso) nos fragilizam. Continuamos atrelados ao nosso modo limitante de ver a realidade.

Agir conscientemente nos faz reconhecer nossa vulnerabilidade e lidar com ela de maneira pacífica, mas não passiva. A escolha que vier após a aceitação nos permite estar completos para a ação e esta é de fato uma escolha, pois é consciente. Saímos da reação automática e adentramos o controle de nossas vidas.

 

REFERÊNCIA:

CHÕDRÕN, PEMA. Quando tudo se desfaz. Orientação para tempos difíceis. Trad. Helenice Gouvêa. Boston: Gryphus, 1997.

 

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Grata,

 

Cristina Monteiro – Psicóloga, Psicopedagoga, Coach (Resiliência) e Instrutora de Mindfulness. Escritora (crônicas literárias, artigos acadêmicos e profissionais). Atende na Clínica com Psicoterapia (enfoque psicanalítico) e Coaching em Resiliência (controle do estresse). Ministra palestras e treinamentos comportamentais em nome da sua empresa (Ponto de Palestras e Treinamentos). Escreve semanalmente neste blog. Acompanhe.

Contate-me: contato@cristinamonteiro.com.br

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